Resolvemos encerrar esta pequena série de artigos (os anteriores estão neste post e neste) que registam as impressões da nossa viagem à Cava, partilhando aqui alguns dos momentos que nos tocaram nesse retorno às raízes.
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A ribeira
A ribeira onde vi as aldeãs lavarem roupa, onde apanhei girinos, onde tomei banhos refrescantes… a ribeira que canta melodiosamente no fundo do vale e nos continua a oferecer recantos de uma tal beleza que nos deixamos facilmente seduzir pelo bucolismo de Bernardim Ribeiro.
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A acústica
A acústica do vale que circunda a Cava sempre me surpreendeu e desta vez surpreendeu igualmente o nosso pequeno núcleo familiar. O imponente anfiteatro montanhoso que rodeia o vale amplia os sons e confere-lhes uma musicalidade própria.
Era espantoso! Outrora o vale pululava de vida com os aldeões nas suas hortas, os rebanhos nas pastagens a tilintar os chocalhos, os carros de bois na sua caminhada vagarosa, a roda do lagar a girar, a ribeira a correr… e todos esses sons ecoavam pelo vale até à aldeia! Ainda mal chegávamos ao alto da Cava e já se conseguia ouvir esse fervilhar de vida.
Hoje este anfiteatro está muito mais silencioso. Há poucos sons a ecoar pelo vale. No meio desse silêncio poderoso foi surpreendente ouvir as nossas vozes e os nossos gritos a ecoarem. Foi a primeira vez que o Maxi-Puto ouviu um eco a sério.
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O silêncio retumbante
O silêncio emoldura os sons. Quando já quase não existem sons para emoldurar, o silêncio é por si só paradoxalmente retumbante. Poderoso. A Cava sempre foi o meu lugar de eleição para apreciar os sons do silêncio, os sons que se destacam no meio do silêncio, mas desta vez… o silêncio destacou-se mais do que qualquer som. O efeito foi avassalador. Um silêncio assim obriga-nos a escutar a nossa voz interior.
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As hortas-jardins
Com a nossa paixão pelas hortas a crescer, foi deveras um ponto alto da viagem apreciar as hortas e jardins locais… teríamos adorado ter tido tempo para as fotografar todas. Fica para a próxima.
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A broa
Ai, a broa! De comer e chorar por mais! Quentinha, acabada de sair do forno, com chouriço, com toucinho… um verdadeiro pecado! Mas um dia não são dias e foi um regalo para os olhos, para o olfato e para o paladar!
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O esmero
Apreciámos muito o esmero revelado nos mais pequenos detalhes: as hortas e os jardins muito cuidados, as ruas limpas, o esforço de preservar as memórias e as tradições…
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A hospitalidade
O ponto mais alto de qualquer ida à Cava é o calor humano e a hospitalidade beirã. Há sempre um sorriso caloroso, dois bons dedos de conversa e uma porta aberta para nos receber… uma broa, um azeite, um queijo ou um vinho para partilhar… uma alegria sincera pelo reencontro. Não há melhor convite ao regresso do que ser bem vindo.
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A resiliência
Outro ponto que muito nos emocionou foi a resiliência. A resistência ao esquecimento e ao abandono. O constante ultrapassar de dificuldades. Esse espírito resiliente que não deixou a aldeia desaparecer mesmo depois de ter sido totalmente rodeada pelo fogo em 2003. O mesmo espírito que motivou a criação da Associação ARCA para dinamizar e recuperar o património da aldeia e manter os cavenses em contacto e ligados às suas origens. Um esforço digno de nota e do qual resultou já a recuperação da primeira escola da aldeia, convertida em dois apartamentos destinados ao alojamento local para quem vem de visita, o restauro da capela e a reabilitação da segunda escola para sede da Associação, espaço de convívio e reunião. Foram também criados um blog e uma página do Facebook. Temos mesmo de lhes tirar o nosso chapéu. Sim, a Cava está viva e recomenda-se!